segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Pronomes pessoais em um dia cabalístico

Poços de Caldas, 10/10/10

Apesar de serem amigos há muito tempo, falavam pouco, só o necessário, o que, para eles, já era mais que o suficiente. Ela era namorada do melhor amigo dele. Amigo que, hoje, nem é tão melhor assim. Ele, secretamente, gostava dela. Ela o achava uma graça. No entanto, nunca acontecia nada... nada acontecia.
Até que, num dia nublado qualquer, ela saiu para passear e, como toda boa moça, não pôde deixar de perder um tempinho vendo vitrines. Ele, inocente, também tinha saído, iria pagar umas contas para o pai. Eles não se viam fazia tanto tempo.
Encontraram-se em uma padaria, ele a olhou bem enquanto estava pedindo as bombas de chocolate. Ele ficou vermelho – costumava ser gordinho quando pequeno. Ela entendeu a vergonha e, então, fez um pedido também: cem gramas de mini-croissants de queijo. Ele era o doce e ela o salgado. Ele sorriu, ela sorriu. Foram comer juntos. Eles conversaram o necessário... e o desnecessário – eles precisavam de um supérfluo: “qual outra música você toca no violão?”, “fala outra coisa em italiano...”.
Quando ele percebeu que ela comia o último bocadinho, o último farelinho, o menino sentiu medo, e enjôo, e pavor, e dor no coração: ela iria embora. E ele não esperava o convite para acompanhá-la até o ponto de ônibus.
Ela estava esperando o ônibus com ele, o Senhor Mãos Suadas, quando começou a chover. Era um temporal tão forte que as árvores poderiam ser arrancadas do chão. Em alguns minutos eles estavam ensopados, mesmo estando sob o teto do ponto de ônibus.
Quando ela se encostou, bem devagarzinho, contra o peito dele, o abraço foi inevitável. Ele estava mais forte. Ela era tão delicada que parecia um passarinho. Ele gostava de passarinhos. Eles encaixaram-se tão perfeitamente, parecia que deveria ter sido sempre assim. A chuva continuava, o ônibus nunca vinha e eles ali.
Ela sentiu o início de um espirro, virou-se fazendo uma careta, bem quando ele se virava para perguntar algo. Ela não espirrou. Ele não perguntou. Os olhos, os narizes, as bocas. O mesmo ar, o mesmo sentimento, a mesma chuva, o mesmo beijo, o mesmo longo e maravilhoso beijo. A barba dele fazia cócegas. Ela tinha um cheiro tão bom. Ela fala italiano! Ele toca violão mesmo!
Os dois entraram no ônibus. Ela desceu vinte minutos depois. Ele a olhava pelo vidro, o ônibus não parou... não parou! Um minuto depois, ele desceu. Abraçaram-se forte. E, a partir daquele dia, nunca mais foram os mesmos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário